“Não Contem com o Fim dos Livros” / “N’espérez pas vous débarrasser des livres”
Páginas: 263
Gradiva
Será que os livros em papel estão condenados? Será que daqui a um século os nossos descendentes irão visitar exposições para descobrirem a Literatura em papel? Será que a revolução tecnológica irá eliminar para sempre o formato do livro? Será que a net e os infindáveis gadgets irão substituir os livros? Será que a Wikipédia irá fazer desaparecer da memória a famosa Enciclopédia Britânica? Será possível viver num universo sem memória dos livros?
A todas estas questões e a muitas outras irá o leitor descobrir a resposta através de uma conversa, que se estendeu por diversos dias, entre Umberto Eco (1932 - 2016) e Jean-Claude Carrière (1931 - 2021), conduzida por Jean-Philippe de Tonnac, em Paris e onde o famoso Umberto Eco, bem conhecido do grande público pelo seu romance “O Nome da Rosa” e não só, mas também um profundo observador dessa ideologia dominante do século XXI, que é o “politicamente correcto”, nos ofereceu um conjunto de saborosas conversas com o argumentista Jean-Claude Carrière, que ficou famoso pela sua colaboração com o cineasta Luis Buñuel e não só.
Umberto Eco
(1932 - 2016)
Tanto Umberto Eco como Jean-Claude Carrière eram coleccionadores de livros antigos, sendo o último casado com uma iraniana, cujo pai “fez um estudo sobre um encadernador de Bagdade, que viveu no século X, chamado Al-Nadim” e também iremos ficar a saber por Jean-Claude Carrière “que foram os iranianos que inventaram a encadernação e mesmo aquela que recobre por completo a obra para a proteger”, terminando este coleccionador de livros antigos por nos dizer que, num período de grandes dificuldades económicas, foi forçado a vender parte da sua Biblioteca para fazer frente aos imponderáveis da vida e aqui tenho de confessar que também já me aconteceu o mesmo, o que nos leva a amar ainda mais os livros que possuímos na nossa Biblioteca.
Johannes Gutenberg
(1400 - 1468)
Ao longo destes saborosos diálogos viajamos desde a Antiguidade, passando pela famosa Biblioteca de Alexandria, até chegar aos nossos dias e os autores desde delicioso livro revelam a sua enorme sabedoria pela forma como abordam o panorama literário e a proliferação dos "best-sellers" e essa “vanity press” (o delicioso termo é aplicado por Umberto Eco), que enche o espaço dos destaques das grandes superfícies culturais, conhecidas vulgarmente por livrarias.
E, como não podia deixar de ser, também esse espaço conhecido por “A Biblioteca” está bem presente nestas conversas, não só a famosa "Biblioteca Pública" onde alguns de nós ainda vão, mas também a nossa querida Biblioteca que vamos construindo ao longo da nossa passagem pelo Universo e aqui tanto Umberto Eco como Jean-Claude Carrière nos falam desse visitante, amigo ou familiar, cuja personagem também já entrou na nossa habitação e ao olhar para as paredes afirma: “Tantos livros! Mas vocês já leram estes livros todos!?”. Sendo precisamente nestes momentos, que nos apetece dar uma dessas respostas que terminaria de imediato com a conversa e possivelmente com a amizade, mas a educação leva-nos a sorrir e a mudar de assunto, já Umberto Eco prefere responder assim, “Não. Estes livros são simplesmente os que terei de ler na próxima semana. Os que já li estão na Universidade.”
"A Bíblia"
O primeiro livro a ser impresso por Gutenberg
(1450 - 1455)
Neste incontornável livro, intitulado “Não Contem com o Fim dos Livros”, também se fala desses maus livros que espalharam o ódio como o “Mein Kampf” e as razões que levam ao seu reaparecimento nas livrarias, mas mais curioso são as respostas que alguns editores deram ao devolverem/recusarem certas obras que fazem parte da memória literária do universo, considerando-a o organizador deste livro, Jean-Philippe de Tonnac, como “uma outra página caricata ou desconcertante da história do livro” e aqui passo a palavra a Umberto Eco que, ao responder à questão, se refere assim ao assunto:
Umberto Eco & Jean-Claude Carrière
“Já mostraram que podiam, por vezes, ser suficientemente estúpidos para recusar certas obras-primas. Trata-se, com efeito, de um outro capítulo da história das burrices. «Sou talvez um pouco limitado, mas não consigo compreender a necessidade de consagrar trinta páginas para narrar como alguém se volta e torna a voltar na cama, sem conseguir dormir.» É o primeiro relatório de leitura sobre “Em Busca do Tempo Perdido” de Marcel Proust. A propósito de “Moby Dick”: «É pouco provável que uma tal obra possa interessar a um público jovem.» Dirigido a Flaubert, a propósito de “Madame Bovary”: «Caro Senhor, o seu romance submerge sob um mar de detalhes bem desenhados, mas inteiramente supérfluos.» A Emily Dickinson: «As suas rimas estão todas erradas.» A Colette, a propósito de “Claudine à l’école”: «Receio não vender mais que dez exemplares.» A George Orwell, sobre “Animal Farm”: «É impossível vender uma história de animais nos Estados Unidos.» Sobre o “Diário de Anne Frank”: «Esta rapariguinha não parece fazer a menor ideia de que o seu livro não pode ser senão objecto de curiosidade.»
Depois Umberto Eco ainda refere como contraponto o que, certos responsáveis dos Estúdios de Hollywood, afirmaram sobre Fred Astaire e Clark Gable e aqui chegado, meus caros amigos, sugiro que comprem este magnífico livro porque, se gostam de livros, este “Não Contem com o Fim dos Livros” tem que constar da vossa Biblioteca.
Rui Luís Lima
Classificação: 5 estrelas (*****)
ResponderEliminarUmberto Eco - (1932 - 2016)
Jean-Claude Carrière - (1931 - 2021)
Numa altura em que os cds desaparecem das lojas e os dvds também, será de perguntar qual o futuro dos livros e assim o célebre filósofo e escritor italiano e o famoso argumentista de Luis Buñuel afirmam "Não Contém Com o Fim dos Livros", uma obra de uma actualidade escrita a duas mãos por dois amantes dos livros, que tornam este volume de uma enorme actualidade e que bem merece ser lido por todos!