"Stromboli" / "Stromboli - Terra Di Dio"
(Itália – 1950) – (107 min. - P/B)
Ingrid Bergman, Mario Vitale, Renzo Cesana, Mario Spanza.
“Stromboli” surge na cinematografia de Roberto Rossellini como a sua primeira colaboração com a actriz Ingrid Bergman, que trocara Hollywood e o “star-system” por amor a um cineasta do qual muito pouco sabia, mas cuja visão de “Roma Cidade Aberta” / “Roma, cittá aperta” , lhe alterou o sentido da vida.
Karin (Ingrid Bergman) é oriunda da Lituânia e, após a invasão do seu país pelas tropas alemãs durante a Segunda Guerra Mundial, refugia-se na Jugoslávia, partindo depois para Itália com um passaporte falso. Iremos assim encontrá-la detida num campo de refugiados perto de Roma, onde vivem inúmeras mulheres à espera de partir e reconstruir uma nova vida. Mas o pedido de Karin para partir para a Argentina é recusado pelo Cônsul daquele país em terras italianas e esta acaba por se casar com um dos muitos soldados italianos que, à noite, vão até ao campo de detenção cortejar as mulheres que aí habitam, para assim poder fugir daquele espaço que a sufoca lentamente.
António (Mário Vitale) é um soldado oriundo da ilha de Stromboli, uma das mais pobres da Itália, ciclicamente devastada pelas erupções vulcânicas. Antigo pescador, ao regressar à ilha, descobre que o seu barco de pesca se encontra perdido para sempre e recomeça o seu trabalho na pesca na companhia de outros pescadores, num barco que não lhe pertence. Por outro lado a sua casa está praticamente destruída no interior e Karin, estupefacta pela terra que a acolhe, tudo faz para embelezar o seu novo lar. Mas a sua presença de imediato desperta a hostilidade das outras mulheres, que invejam a sua beleza e se recusam a entrar na sua casa, encontrando conforto não no marido mas no faroleiro (Renzo Cesana), que tinha conhecido no barco que a levara para Stromboli.
Um dia em que está junto às águas do mar, a ver as crianças a brincar, decide fazer-lhes companhia até que uma onda a arrasta e será precisamente o faroleiro que se encontrava próximo a segurá-la, perante os olhares rancorosos das outras mulheres da ilha que observam o que se passa.
Nesse mesmo dia, ao regressar a casa, António sabe do sucedido e ao passar pelas ruas ouve vozes que lhe chamam cornudo e de imediato decide encarcerar a mulher em casa, depois de lhe ter batido. E será o faroleiro a ir retirar Karin da sua prisão, oferecendo-se para a levar para o outro lado da ilha onde existe uma outra povoação. Mas Karin, apesar de estar grávida de três meses, não aceita ir de barco com ele embora aceite o seu dinheiro, decidindo subir as montanhas e contornar o vulcão, para fugir do seu destino.
A rodagem de “Stromboli” foi atribulada, já que o argumento de Roberto Rossellini escrito por Sérgio Amidei era mínimo e depois os correspondentes estrangeiros da imprensa internacional decidiram invadir a ilha para acompanhar a rodagem, apesar de esta ser de difícil acesso, porque Ingrid Bergman continuava casada com o marido, embora estivesse a viver com o cineasta italiano, originando um escândalo de grandes dimensões. Por outro lado, os actores que contracenavam com a actriz sueca eram quase todos amadores e Roberto Rossellini tinha imensa dificuldade em os dirigir.
Apesar de todos estes obstáculos, a ex-estrela de Alfred Hitchcock surge em “Stromboli” oferecendo-nos a sua beleza profunda, basta ver os grandes planos de Ingrid Bergman ou a sequência profundamente sensual dela, no mar com as crianças.
As dificuldades e o martírio porque passou a famosa actriz sueca na rodagem da película foram enormes, chegando a queimar os pés na célebre subida para contornar o vulcão. Já o cineasta conseguiu oferecer-nos mais uma obra neo-realista, de cujo género foi o fundador com Luchino Visconti, nunca nos poderemos esquecer do genial “Obsessão” / “Ossessione” que, com “Roma Cidade Aberta” / “Roma, citá aperta”, marcam o nascimento desse género cinematográfico.
“Stromboli” oferece-nos ainda duas sequências que fizeram história: a célebre pesca do atum, que irá aterrorizar Karin, assim como o vulcão em erupção, cujas imagens ficaram na história do cinema e tornaram célebre a película do cineasta italiano.
E quando Karin, em fuga do marido, começa a chegar à zona da erupção, os gases saídos do vulcão impedem a sua caminhada perdendo a mala e o dinheiro que levava consigo, para recomeçar uma nova vida e num acto de desespero ou fé (cada um entende como quer), de joelhos sobre as cinzas do vulcão, ela evoca o nome de Deus e pede a sua ajuda para iluminar o caminho da sua existência.
Rui Luís Lima
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