F. W. Murnau
"O Último dos Homens" / "Der Letzte Mann"
(Alemanha - 1924) – (77 min – P/B - Mudo)
Emil Jannings, Maly Delschaft, Max Hiller, Emilie Kurz
Quando F. W. Murnau realizou “O Último dos Homens”, o “kammerspiel” atingiu o seu apogeu e ao vermos esta película somos obrigados a constatar tal facto, porque aqui a história do porteiro do Hotel “Atlantic”, que um dia é destituído do seu cargo, é-nos narrada sem qualquer inclusão de intertítulos, com excepção da carta que lê onde lhe é comunicada a sua destituição do lugar que ocupou até então na hierarquia do hotel, passando a ser o responsável pelos lavabos do hotel.
Já agora convém referir que existem duas versões: uma em que o filme termina com ele reduzido a um estado de perfeita perdição, depois de ter perdido o seu belo casaco, símbolo perfeito da sua importância perante o olhar alheio, ficando para sempre confinado a essa cave onde se situam os lavabos onde irá morrer, intitulada "Der Letzte Mann"; e uma outra versão em que um multimilionário excêntrico lhe deixa a sua fortuna, porque ele foi o último homem a vê-lo vivo, resgatando-o do inferno e tornando-o um homem respeitado e venerado, fruto do dinheiro que possui, intitulada "The Last Laugh".
Esta segunda versão, a existente no dvd “German Silent Masterworks”, terá sido filmada por imposição do protagonista Emil Jannings (o célebre Professor Unrat de “O Anjo Azul” de Joseph von Sternberg) e do produtor Erich Pommer, após a recepção negativa ao filme, na noite de estreia.
Mais uma vez F. W. Murnau nos oferece uma obra-prima do cinema ao realizar esta película, onde a luz da sua Arte consegue verdadeiros milagres, narrando a vida de um homem que, fruto da sua profissão de porteiro do Hotel, é venerado e respeitado por todos os que o conhecem, até à chegada dessa noite de chuva em que a idade o irá trair, quando o gerente do Hotel o encontra sentado na recepção a beber um copo de água e a descansar devido ao esforço despendido no transporte de uma mala enorme de uma cliente, debaixo de chuva.
Essa falta será devidamente anotada e no dia seguinte, quando ele se dirige para o Hotel, irá descobrir que o seu lugar já fora ocupado por alguém mais novo, ostentando um porte distinto. A partir desse dia será o responsável dos lavabos, perdendo o direito a ostentar esse enorme casaco de porteiro, sinónimo de divisas perdidas na guerra da vida. Ele irá por todos os meios esconder a sua nova condição dos que lhe são próximos, até chegar esse momento fatal em que a verdade surge de forma abrupta, transportando no seu interior a mesquinhez humana, tão bem retratada no comportamento de todos os que o rodeiam.
A forma como F. W. Murnau e o seu operador, o genial director de fotografia Karl Freund nos oferecem o quotidiano banal deste homem, focalizando a acção no Hotel, onde o movimento incessante das portas, a abrir e a fechar, são como caminhos que se abrem e fecham consoante os seus protagonistas. Por outro lado oferece-nos o respirar das ruas dessa Berlin, ao mesmo tempo que nos convida a entrar no bairro onde o porteiro do Hotel habita, retratando em traços precisos o rosto da Alemanha desses anos.
Seja qual for o final escolhido, teremos sempre em “O Último dos Homens” uma das obras mais importantes da filmografia de F. W. Murnau, para além de mais uma espantosa interpretação desse gigante da 7ª Arte chamado Emil Jannings.
Rui Luís Lima
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