sábado, 1 de fevereiro de 2025

Jean-Pierre Melville - “O Segundo Fôlego” / “Le Deuxiéme Souffle”


Jean-Pierre Melville
“O Segundo Fôlego” / “Le Deuxiéme Souffle”
(França – 1966) – (144 min. - P/B)
Lino Ventura, Paul Meurisse, Christine Fabréga, Pierre Zimmer.

O ano de 2007 viu o “polar” renascer em terras francesas, através da mão de Alain Corneau, que não é um perfeito desconhecido para o cinéfilo, basta recordar essas obras intituladas “Série Negra” / “Série Noire”, "França Sociedade Anónima” / “France société anonyme”, “Todas as Manhãs do Mundo” / “Tous les matins du monde” ou o nosso “Nocturno Indiano” / “Nocturne indien”, para estarmos perfeitamente identificados com o cineasta, porque se trata precisamente de um autor. E alguns estarão a pensar, porque razão se está a falar de Alain Corneau (que nos deixou em 2010), a propósito de um filme de Jean-Pierre Melville? A razão é simples. Como alguns já devem se ter apercebido, o penúltimo filme de Corneau é um “remake” de “Le Deuxième Souffle” de Jean-Pierre Melville, um dos seus filmes mais célebres, ele que foi o cineasta do "polar" por excelência.


No filme de Alain Corneau temos Daniel Auteil na personagem que pertenceu a Lino Ventura, a bela Mónica Bellucci, loura como convém, para interpretar a personagem de Manouche que foi de Christine Fabréga, enquanto o célebre comissário Blot interpretado por Paul Meurisse nos chega através da presença de Michel Blanc e, por fim, essa personagem enigmática de seu nome Orloff, em tempos vestida por Pierre Zimmer, surge pela mão desse grande actor que é Jacques Dutronc. Mas como estamos aqui para falar do filme de Melville, deixamos este pequeno aperitivo do filme de Alain Corneau e regressamos ao Jean-Pierre.


“O Segundo Fôlego” foi a última película a preto e branco do cineasta, nascida de um argumento escrito por José Giovanni, outro nome cuja obra merece ser descoberta. Ao ler o argumento, Jean-Pierre Melville viu de imediato a figura de Lino Ventura a vestir a pele do gangster ultrapassado, o célebre Gustave Minda, conhecido no meio por “Gu”, ora a película começa precisamente com a fuga de “Gu” da prisão, uma fuga que se revela tortuosa até chegar junto de Manouche, a fim de preparar a sua partida do território francês. Mas sendo ele um dos mais famosos ladrões, tem a competir com ele o melhor dos melhores, o comissário Blot (magnifico Paul Meurisse), que não olha os meios para atingir os fins e que trata os gangsters por tu, indo ao território inimigo sozinho, demonstrando um sangue frio absoluto.


Estamos assim perante uma dupla de gangster/policia, num duelo de peso e será com isso precisamente que iremos deparar ao longo do filme, com duas interpretações extraordinárias, por um lado temos a contenção e os princípios da velha guarda de Gustave Minda e por outro lado o cinismo e a eficácia de Blot.


O comissário põe toda a França em busca do famoso foragido, enquanto este decide participar num último golpe a fim de obter dinheiro para a sua fuga do país. Se o assalto corre bem, o pior vem sempre depois com as desconfianças e as suspeitas como é habitual, especialmente quando pelo meio está metido um homem com uma moral muito própria no mundo da noite, chamado Orloff, essa figura enigmática, também ela com alguns princípios.


Quando tudo parecia perfeito, Gustave Minda é detido e após cair na estratégia da polícia, que faz passar os seus homens por gangsters, é montada uma operação para o mostrar como denunciante, lançando-se a notícia no meio. E será esse desejo de limpar o seu “bom-nome de gangster” que o levará a ir buscar forças para fugir da polícia e demonstrar a todos que foi vítima de um golpe muito baixo das forças da ordem. “Gu” pretende limpar o seu nome, mas ao ser cercado pela polícia vê o fim a aproximar-se e será o comissário Blot a deixar cair no asfalto a agenda onde o seu colega de profissão confessava a forma pouco ortodoxa como fez passar os seus homens por gangsters, manipulando a verdade dos factos. Será precisamente ao insistir com o jornalista para apanhar a agenda, que o enigmático comissário Blot reescreve a história de Gustave Minda, o último gangster!


Jean-Pierre Melville consegue oferecer-nos um filme fabuloso, não só pela forma como dirige os actores, mas também pelo ritmo que oferece na montagem, não existindo tempos mortos no filme. Mesmo quando vamos assistindo aos preparativos do assalto, percebemos que estamos a viver o tempo interior dos personagens, passando de simples espectadores a profundos intervenientes na película com direito a fazermos o nosso próprio julgamento e para tudo isto é fundamental o contributo de José Giovanni, que em tempos viveu no meio, sendo até preso e condenado, mas isso já é outra história.

Rui Luís Lima

1 comentário:

  1. Jean-Pierre Melville - (1917 - 1973)
    Classificação: 4 estrelas (****)
    Estreia em Portugal: 1 de Março de 1968.

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