quinta-feira, 15 de agosto de 2024

O Cinema do «Remake» ou o «Remake» no Cinema!


O Cinema do «Remake» ou o «Remake» no Cinema!

Uma das questões com que se tem debatido a indústria cinematográfica norte-americana, nos últimos anos, tem sido a política do “remake”, cuja tradução à letra é “refeito” e é disso precisamente que se trata: refazer uma obra. Os anos que separam a primeira película da segunda são, geralmente, na ordem das dezenas e o seu realizador, quase sempre, outro cineasta. Mas existem algumas excepções como é o caso de Tod Browning, que fez “remakes” dos seus próprios filmes, como por exemplo “Outside The Law” datados respectivamente de 1921 (filme mudo) e 1930 (filme sonoro) ou então o caso mais famoso, protagonizado por Alfred Hitchcock e o seu filme “The Man Who Knew Too Much”/”O Homem Que Sabia Demais”, sendo a primeira película rodada a preto e branco em 1934, para 12 anos depois, em 1956, o Mestre fazer o “remake” a cores com a célebre Doris Day ao lado de James Stewart.

"Nosferatu"

Mas que regras estão subjacentes ao “refazer uma obra”: estabelecer um paralelo estudando a distância temporal, transformar a acção, possibilitando apresentar cenas que as censuras anteriores impediam (o célebre código Hays), introduzindo a tecnologia que ontem não se encontrava ao seu alcance, ou seja os chamados efeitos especiais?

No fundo trata-se disto tudo e muito mais, pois por vezes o “remake” é tão diverso, que o filme se assume quase como “original”. Outras vezes trata-se de homenagear ou recordar algo ou alguém, como é o caso de “Nosferatu”, sendo o original da responsabilidade de F. W. Murnau e o “remake” assinado por Werner Herzog, já para não falarmos nesse fabuloso filme elaborado por E. Elias Merghe recriando as filmagens da obra de F.W. Murnau, intitulado “A Sombra do Vampiro”/”Shadow of the Vampire”.

"Orgulho e Preconceito"

Em “No Limiar da Realidade”/”Twilight Zone”, o quarteto constituído por Steven Spielberg / John Landis / Joe Dante / George Miller, já apresenta um carácter específico e fronteiriço, no interior do “remake”, porque tem como origem uma série televisiva. Mas, por falarmos em séries televisivas, não podemos esquecer o caso de “Orgulho e Preconceito” / ”Pride & Prejudice”, um dos muitos romances escritos por Jane Austen e que, tal como outros livros da famosa escritora inglesa, tem sido adaptado ao pequeno e grande écran. Recorde-se que foi em 1938 a data da primeira adaptação televisiva de “Orgulho e Preconceito”, da responsabilidade de Michael Berry, depois ao longo dos anos, foram inúmeras as vezes que esta obra literária, mundialmente famosa, se viu adaptada para a televisão (1938;1940;1952;1958;1967;1980;1995), no entanto, devido às novas tecnologias e o surgimento do dvd e da televisão por cabo é a versão de 1995, com um fabuloso Colin Firth a fazer de Mr. Darcy e uma maravilhosa Jennifer Ehle a interpretar a figura de Elizabeth Bennet, que nos fica na memória para sempre, porque quando Joe Wright nos oferece uma nova versão cinematográfica, tendo Keira Knigtley como protagonista, o seu maneirismo e a forma como usa o plano sequência leva-nos a esquecer rapidamente do filme e de imediato nos surge na memória a célebre versão da BBC, datada de 1995.

"Psico"

A outra das características do “remake” é a denominada “sequela” tal como sucede com o magnifico “Piranha” ou “Tubarão” / “Jaws”; os medíocres “Porki’s”, “Gelado de Limão” / “Eskimo Limon” ou “American Pie” para citar um género; já “Psico”, o célebre filme de Alfred Hitchcock, tem o “remake”/sequela efectuado por Richard Franklin, reunindo novamente Anthony Perkins e Vera Miles muitos anos depois, iniciando a película precisamente onde Hitchcock o terminara, utilizando os mesmos actores e rodando nos mesmos locais vinte anos depois e o caso do “remake” de “Psico” levado a cabo por Gus Van Saint, refazendo plano a plano a famosa obra de Alfred Hitchcock, numa homenagem bem cinéfila.

"The Thing"

Depois, há sempre aqueles casos em que muitas vezes o “remake” parece superior ao original e dizemos parece, porque muitas vezes somos enganados pelo dispositivo ou meios, se preferirem, postos à disposição dos cineastas, tendo em conta o passar dos anos e o avanço da tecnologia dos efeitos especiais.

"Cat People"

Citemos dois casos concretos e opostos: “The Thing” da dupla Christian Niby e Howard Hawks e a versão de John Carpenter, onde pontificam os efeitos especiais, em que perante a visão de cada um dos filmes, somos forçados a reconhecer que John Carpenter conseguiu através da dramaturgia e o suspense instituir um clima de terror, em que o próprio espectador termina por viver no próprio espaço onde se esconde “The Thing”; já o caso de “Cat People” / “A Pantera” do genial Jacques Tourneur, que viu a sua obra-prima ser refeita pelo excelente Paul Schrader, não tendo o cineasta americano conseguido atingir a qualidade da obra original, substituindo o suspense e a elipse pelo erotismo e o “dejá vù”, embora não atingindo os seus objectivos, Paul Schrader consegue, mesmo assim, elaborar em “A Felina” / “Cat People” uma obra que merece ser (re)visitada.

"Love Affair"

Todos os anos os “remakes” se sucedem a uma velocidade vertiginosa, alimentando-se Hollywood tanto no cinema clássico como no cinema francês e até no oriundo do norte da Europa, transformando os “remakes” e as sequelas num género cinematográfico, em que o que está em causa não é essa homenagem cinéfila, tão em voga no cinema clássico, basta recordar o caso desse maravilhoso melodrama dirigido por Leo McCarey, intitulado “Love Affair” / “Ele e Ela” de 1939 com Irene Dunne e Charles Boyer, do qual o mesmo cineasta irá fazer um dos mais célebres “remake”, ao decidir refazê-lo convidando Cary Grant e Deborah Kerr para o mais que conhecido “An Affair to Remember” / “O Grande Amor da Minha Vida” de 1957, para muitos anos depois Warren Beatty decidir fazer uma nova versão, como prenda para a sua esposa Annette Bening, nascendo “Love Affair” / “O Amor da Minha Vida”.

"West Side Story"

Mais recentemente tivemos a aventura de Steven Spielberg no interior do célebre musical ao decidir fazer o "remake" de um dos mais famosos musicais da história do cinema, que juntou três nomes de áreas bem distintas: o cineasta Robert Wise; o compositor e maestro Leonard Bernstein e o coreógrafo Jerome Robbins. Estamos a falar de "West Side Story" que em Portugal foi baptizado de "Amor Sem Barreiras" e mais uma vez assistimos aquando da estreia da película de Spielberg da oportunidade perdida de o original ser reposto em cópia restaurada, para assim muitos poderem comparar ambos filmes e tirarem as suas conclusões sobre esta "indústria" do "remake" que floresce homenageando ou pilhando, escolham o termo, a memória da Sétima Arte.

A Hollywood deste século XXI só olha para o “remake” ou sequela se ela lhe fornecer excelentes receitas, na realidade somos nós espectadores de cinema e entusiastas do universo cinematográfico que tudo deveremos fazer para que a memória do cinema permaneça bem viva, como a bela e inesquecível Sétima Arte!

Rui Luís Lima

1 comentário:

  1. Nos dias de hoje cada vez mais encontramos "remakes" de filmes, mas de uma qualidade muito duvidosa, já que quase sempre reina a mediocridade. Mas nem sempre foi assim, porque os "remakes" eram raros e quando se faziam era para homenagear um filme, género cinematográfico ou realizador. Porém os tempos são outros e neste século xxi o cinema vive o período mais negro da sua história, com o fim da "política dos autores", a desertificação das salas e o esquecimento da memória do cinema.

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