terça-feira, 10 de setembro de 2024

William Hurt - (1950 - 1922) - O Actor Tranquilo!


William Hurt - O Actor Tranquilo!

Quando alguém me fala de William Hurt, o actor tranquilo que gostava de estar longe de Hollywood, dois filmes iluminam de imediato a minha memória: são eles “O Turista Acidental”/”The Accidental Tourist” a mais bela e fidedigna adaptação de uma obra literária, da autoria de Anne Tyler, cuja edição portuguesa editada já lá vão uns anos, esgotou e nunca mais viu a luz do dia e a estreia de Lawrence Kasdan como cineasta no thriller fatal “Noites Escaldantes”/”Body Heat”, mas depois há essa obra pouco conhecida, ou direi antes muito pouco vista, porque lá falada ela foi, refiro-me a “O Beijo da Mulher Aranha” / “Kiss of The Spider Woman” que o iria conduzir à conquista do Oscar para o Melhor Actor e que interpretação ele nos ofereceu!


A sua casa é simples e gosta de manter uma certa distância entre ela e Los Angeles. Chama-se William Hurt, costuma passear calmamente nas ruas, sem ser reconhecido e define-se como um típico vizinho do lado. Com as suas “jeans” e “t-shirts”, vivendo sossegadamente, sem ter o nome e a fotografia nas páginas dos jornais e revistas da especialidade, continuando a poder usufruir plenamente da sua vida privada, ao contrário de muitos colegas de profissão, completamente engolidos pela máquina promocional. Ao contrário do seu colega John Hurt, não gosta de entrar em profundidade nos personagens, permanecendo neles depois das filmagens. Simplesmente altera o seu comportamento durante a representação, oferecendo o seu melhor e, quando a interpretação termina, regressa ao seu pequeno mundo.


Ao interpretar a figura de um homossexual em “O Beijo da Mulher Aranha” / “The Kiss of The Spider Woman”, realizado pelo cineasta argentino Hector Babenco, o actor William Hurt viu o seu magnífico trabalho galardoado pelos seus pares da Academia de Hollywood, com o merecido Oscar para o Melhor Actor.


Embora aconselhado por alguns amigos a não aceitar o papel, William Hurt como um bom jogador de poker não virou a cara, participando no maior desafio da sua carreira. Aliás uma personagem idêntica já tinha sido interpretada por William Hurt na peça “Fifth of July”. Para ele foi com a película “Making Love” de Arthur Hiller (o cineasta de “Love Story”) que o grande público “descobriu” no grande écran o retrato de uma outra realidade, que até então vivia no “armário”, não o preocupando nada a sua representação, seja no cinema ou no teatro.


Foi com “Viagens Alucinantes” / “Altered States” de Ken Russell, que William Hurt começou a ser notado no cinema, ao mesmo tempo que dividia a sua carreira entre o grande écran e o palco. “Noites Escaldantes”/”Body Heat” de Lawrence Kasdan ao lado da bela Kathleen Turner, tornaram-no num nome citado com regularidade entre a imprensa da especialidade e a crítica cinematográfica e a sua colaboração com Lawrence Kasdan continuou nesse retrato de uma geração chamado “Amigos de Alex” / “The Big Chill”. Depois fez par com Sigourney Weaver em “The Janitor” / “Os Olhos da Testemunha”, realizado por Peter Yates, para mais tarde nesse território gelado da Rússia, fazer par com Joanna Pacula no fabuloso thriller “O Mistério de Gorky Park” / “Gorky Park”, realizado com mestria por Michael Apted.


Como podemos ver William Hurt tem revelado todo o seu enorme talento com uma simplicidade e um rigor digno de aplauso, cativando de imediato o espectador, seja qual for o género cinematográfico abordado, oferecendo-nos sempre interpretações inesquecíveis.


Na película de Hector Babenco, “O Beijo da Mulher Aranha”/ “The Kiss of the Spider Woman”, o actor William Hurt ao vestir a pele de Molina, compartilha o seu espaço no território prisional, com Valentin (Raul Julia), um jornalista, preso político. O que está em causa neste filme de Hector Babenco é a luta pela sobrevivência, num meio prisional hostil, entre dois homens completamente distantes e diferentes um do outro. Será quando Molina decide abandonar o seu universo e entrar no mundo de Valentin, que encontra a violenta amargura da morte.


Depois de terminadas as filmagens de “O Beijo da Mulher Aranha”, William Hurt regressa a casa e parte novamente para o palco, esse sua outra paixão, entretanto a peça “Filhos de Um Deus Menor”/”Children of a Lesser God” é adaptado ao cinema e William Hurt lá está fascinado pelo tema, novamente vestindo uma outra personagem e encontrando um novo amor, dentro e fora do “plateau”, mas que, como sabemos, não iria durar muito tempo.


Lawrence Kasdan irá convidar William Hurt para mais dois filmes, a comédia negra “Amar-te-ei Até Te Matar” / “I Love You to Death” e esse filme da minha vida “O Turista Acidental” / “The Accidental Tourist”, não me perguntem quantas vezes li o livro, a edição portuguesa está em “farrapos”, de forma que me socorri nos últimos anos de uma edição americana que leio e releio nas férias com um prazer infinito, depois há o filme e aqueles personagens desamparados à beira do abismo que amamos profundamente.


E continuando nos livros com o William Hurt, vamos encontrá-lo nesse verdadeiro “movie” sobre fumo e cigarros realizado e escrito por esse nome único das letras norte-americanas que se chama Paul Auster e ali, na famosa Brooklin, descobrimos o Bill fumando a interpretar em “Smoke” um personagem chamado Paul Benjamin, precisamente o pseudónimo com que Paul Auster assinou o seu primeiro policial intitulado “O Jogo dos Enganos”/”Squeeze Play”.


Depois, nunca será demais chamar a atenção sobre essa obra-prima do James Brooks sobre os “jogos” do audiovisual e a tristemente famosa informação televisiva (que tão maltratada anda por esse mundo fora, quase sempre ao lado do poder económico), intitulado “Edição Especial” / “Broadcast News”, com Holly Hunter e Albert Brooks a acompanharem William Hurt nas sua ascensão meteórica na cadeia de televisão, na qual muitas vezes um sorriso substitui melhor uma palavra e na qual a encenação das notícias e reportagens termina muitas vezes com os laços que ligam amizades de longa data.


Este magnífico filme merece ser reavaliado à luz do que se passa no audiovisual deste século XXI, onde proliferam os canis informativos, condicionados pelos desejos das diversas Agências de Informação que ditam a História Contemporânea nessa caixa que, decididamente, mudou o mundo.


Nesta pequena viagem pelo cinema na companhia de William Hurt, nunca nos poderemos esquecer de duas personagens tão distantes como as que encontramos em “Alice” de Woody Allen e o psicanalista de “Um Divã em Nova Iorque”/”Un Divan a New York” da belga Chantal Akerman, e cujo duelo entre ele e Juliette Binoche é uma verdadeira comédia de enganos, que nos deixa à beira de um maravilhoso ataque de lágrimas de tanto sorrir ao acompanhar o desenrolar da história. Senão conhecem aqui vos deixo um breve resumo: um psicanalista e uma bailarina “desempregada” trocam de casa durante um período de férias (algo que hoje em dia está muito na moda), ele acaba por não se adaptar a Paris e ela começa a escutar os pacientes que a procuram, julgando que ela é a psicanalista que o substitui nas férias e os resultados revelam-se um sucesso para os diversos doentes, após ela seguir o conselho generoso de uma amiga. Assim basta ter um ar sério perante o paciente deitado no divã e dizer... hum, hum... e depois estender a mão para receber o respectivo pagamento, mas depois o romance surge, porque o Dr. Henry Harriston (William Hurt) decide descobrir o que se passa e faz-se passar por doente, mas isso já é outra história, que não vos conto, procurem o filme da Chantal Akerman e divirtam-se!


Muitos ainda se recordam da figura do cientista interpretado por William Hurt em “AI: Artificial Inteligence” da dupla Stanley Kubrick e Steven Spielberg, mas poucos se lembram do inspector Frank Busmtead de “Dark City”, esse extraordinário filme de ficção-científica, assinado pelo Alex Proyas, que está a passar nos canais de cabo da nossa televisão e que já foi editado em DVD, revelando-se uma das maiores surpresas no género, ao mesmo tempo que se transformou num verdadeiro “cult-movie”.


No ano de 2006 , William Hurt na película de David Cronenberg “A History of Violence”, volta a ser nomeado para o Oscar do Melhor Actor Secundário, anteriormente tinha também sido nomeado para o Oscar de Melhor Actor com as películas “Filhos de Um Deus Menor” e “Edição Especial”.


Com a explosão dos canais televisivos e o sucesso das séries, que tantos actores de cinema têm cativado, William Hurt, também se deixou seduzir e nunca é demais referir a sua participação em “Damages” / “Sem Escrúpulos”, uma das nossas séries favoritas do pequeno écran e se ele tanto surge em pequenas aparições no cinema como sucede em “Syriana”, "Robin Hood" ou em “O Bom Pastor” / “The Good Sheppard” realizado por Robert de Niro, também gostamos de o ver em “Mr. Brooks” onde nos surge como o “alter-ego” ou a má consciência, no verdadeiro sentido da palavra, de Kevin Costner.


Ao finalizar esta pequena viagem pela carreira deste extraordinário actor chamado William Hurt, que nos deixou a 13 de Março de 2022, aqui vos deixo o convite para descobrirem os seus filmes, especialmente aqueles a que nos referimos, pois como perceberam falámos apenas dos nossos favoritos.

Rui Luís Lima

1 comentário:

  1. Ao longo da sua carreira William Hurt participou em mais de cem filmes tendo conquistado 17 prémios incluíndo O Oscar para melho actor.

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