“The Householder”
(India - 1963) – (102 min. - P/B)
Shashi Kapoor, Leela Naidu, Durga Khote, Achia Sachdev.
O primeiro filme de James Ivory que vimos no cinema foi o célebre “Verão Indiano” / “Heat and Dust” e desde então decidimos seguir-lhe a carreira. Este americano nascido no Oregon e que estudou na Califórnia, viveu na Índia durante alguns anos, por vezes até vê a sua nacionalidade trocada porque muitos o julgam inglês, devido ao seu estilo, mas também ao facto de ele ter levado ao écran diversas obras de E. M. Forster (“Maurice”, “Quarto com Vista” / “Room With a View” e “Regresso a Howards End” / “Howards End”), assim como obras de Henry James, tendo uma certa apetência por adaptar obras literárias ao cinema, sendo elas clássicas ou modernas, como sucederia com “Escravos de Nova Iorque” / “Slaves of New York”e “Os Despojos do Dia” / “The Remains of the Days”.
Quando realizou “The Householder”, em 1963, apenas possuía no seu curriculum dois filmes: “Venice: Thems and Variations” e “The Sword and The Flute”, este último realizado no continente indiano e com música de Ravi Shankar, na época desconhecido no Ocidente, porque ainda não tinha nascido o seu encontro com o Beatle George Harrison, nem as suas colaborações com John McLaughlin. E seria durante uma projecção desta curta-metragem que James Ivory iria conhecer o homem que irá mudar a sua vida para sempre, o produtor Ismail Merchant (que também irá passar pela realização, sendo a sua obra “The Mystic Masseur” / “O Massagista” uma maravilhosa pérola baseada num livro de V. S. Naipaul, (na época passou numa das salas do cinema Mundial), que irá produzir todos os seus filmes até falecer em 2005. Aliás no dvd do filme “Le Divorce” / “O Divorcio” poderemos ver num dos extras uma entrevista com Ismail Merchant, em que ele nos relata o seu encontro com James Ivory, uma verdadeira delicia.
Nos anos sessenta Satyajit Ray era um cineasta já bem conhecido no Ocidente e James Ivory via nele uma fonte inspiradora, sendo muito importante o seu contributo na montagem final de “The Householder”. Da mesma forma que “The River” / “O Rio Sagrado” de Jean Renoir onde Satyajit Ray foi assistente, foi a outra obra cinematográfica que marcou James Ivory no seu fascínio pela Índia.
“The Householder” irá assim reunir estes dois homens aos quais se irá juntar a argumentista de todos os seus filmes posteriores Ruth Prawer Jhabvala, aliás o argumento baseia-se num livro dela. E o mais curioso nesta película, datada de início dos anos sessenta que nos relata o primeiro ano de vida conjugal de um jovem casal, foi não ter sido vítima da passagem do tempo, devido ao génio de James Ivory.
No início do filme vemos Indu ((Leela Naidu) a ir ter com o marido para o informar que têm um convite para irem a um casamento. Na época, o matrimónio na Índia ainda era arranjado pelas respectivas famílias dos noivos e quando Prem (Shashi Kapoor), ao chegar ao local com a mulher, vê o desalento do amigo que se vai casar, decide contar-lhe como foi o seu primeiro ano de vida em comum e de imediato a película se transforma num longo “flashback” em que nos são narrados os problemas que Prem e Indu tiveram que enfrentar até encontrarem a felicidade.
Iremos assim assistir a essa relação entre dois estranhos que aprenderam a conhecer-se e a amar-se, ultrapassando todos os obstáculos encontrados ao longo do caminho. Dificuldades que continuamos a encontrar tantas vezes nos dias de hoje: a falta de dinheiro, a protecção da mãe e a luta pela felicidade.
Prem, um jovem professor universitário, vê sempre a sua autoridade a ser posta em causa tanto pelos alunos como pelos colegas mais velhos, por outro lado ao pretender encontrar na esposa uma mulher idêntica à mãe que o criou irá descobrir que a sua mulher não é propriamente submissa, tendo direito à sua própria identidade.
Filmado sempre em exteriores devido à falta de dinheiro, “The Householder” relata-nos uma história de sobrevivência, em que o humor não está ausente, basta ver as tentativas de Prem perante o director para pedir aumento de ordenado ou perante o senhorio da casa onde vive para lhe baixar a renda. Depois haverá sempre a chegada da sua mãe para pôr tudo em ordem na casa, criticando sempre a esposa, que acabará por abandoná-lo porque já não tolera mais as intromissões ditatoriais da sogra, acabando por regressar mais tarde por amor ao marido, construindo ambos um plano para “convidar” a mãe a partir para junto de uma das outras filhas, para ir tratar dos netos. E será esse mesmo amor que irá abrir o caminho para a felicidade, tão ambicionada por ambos.
James Ivory oferece-nos um retrato espantoso do quotidiano desses anos na Índia, onde não faltam esses americanos que buscam no território o perfeito encontro espiritual, mas que por outro lado possuem os meios necessários para viverem uma vida sem problemas económicos como sucede com o seu amigo americano.
Descobrir “The Householder” que já se encontra editado em dvd (importação) é a nossa proposta para hoje e nele poderemos sempre aprender mais um pouco sobre o universo desse maravilhoso cineasta chamado James Ivory.
Rui Luís Lima
O encontro do cineasta norte-americano James Ivory com a Índia deve-se muito ao cinema de Satyajit Ray e ao filme "O Rio Sagrado" de Jean Renoir, o que se seguiu depois foi um conjunto de películas a navegar de forma perfeita pelo interior do continente indiano, retratando vidas, costumes e sentimentos.
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