quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

Alfred Hitchcock - "Correspondente de Guerra" / "Foreign Correspondent"


Alfred Hitchcock
"Correspondente de Guerra" / "Foreign Correspondent"
(EUA – 1940) – (120 min. - P/B)
Joel McCrea, Laraine Day, Herbert Marshall, George Sanders, Albert Basserman.

Quando alguém programa um ciclo de cinema sobre o papel do jornalismo no mundo, há sempre um filme que figura na lista e esse filme chama-se “Foreign Correspondent” / “Correspondente de Guerra” e ele é assinado por Alfred Hitchcock ou melhor o Hitch americano, porque se trata da sua segunda película em Hollywood, a primeira como se devem recordar foi “Rebecca”. E aqui o cineasta partiu mesmo da América, em rodagem pela Holanda e Inglaterra, essa mesma Inglaterra que já lutava sozinha contra a poderosa máquina de guerra alemã. Estamos assim perante uma contribuição do Mestre para o esforço de guerra dos seus compatriotas, recorde-se que a América nesta época, 1940, ano da produção do filme, ainda cultivava o seu famoso isolacionismo, só entrando no conflito após o ataque japonês a Pearl Harbour.


Mas a América sempre seguiu atentamente os acontecimentos e a nossa história trata disso mesmo: quando o Director do jornal “Globe”, farto das notícias recebidas dos seus diversos correspondentes, decide enviar um repórter criminal para o terreno, transformando-o no verdadeiro correspondente de guerra, porque para tal tarefa é necessário um homem de acção e nada melhor do que Johnny Jones (Joel McCrea), que possui um curriculum cheio de atritos, sempre em busca da informação preciosa, ele até se tinha envolvido numa reportagem anterior numa cena de pugilato com a autoridade.


Será este homem, que bateu num polícia, que irá partir para Londres na véspera do início da guerra, para fazer a cobertura dos acontecimentos. Na mala Johnny Jones leva já marcado um encontro com Stephen Fischer (o espantoso Herbert Marshall), líder de uma Organização Pacifista, que lhe irá dar indicações preciosas para a sua missão de correspondente. Ao chegar a Londres descobre que o seu colega de jornal, residente na cidade, apenas envia os relatórios do governo e pouco mais, dedicando-se a uma vida pacata e desinteressante. Será a caminho de um jantar/conferência que irá conhecer o famoso diplomata holandês Van Meer (Albert Basserman), aproveitando uma boleia de táxi que forçou, seguindo as suas regras de jornalista intrometido à caça de uma história, explosiva de preferência.


Durante o jantar irá conhecer a bela Carol (Laraine Day), filha do dirigente pacifista, ao mesmo tempo que descobre que o célebre diplomata desapareceu do jantar, apesar dele lhe ter dado boleia e de ter entrado com ele na sala. Por ali algo não bate certo.


Após uma viagem à famosa terra das túlipas, irá assistir ao assassínio do diplomata, mesmo na sua frente e aqui temos logo uma das mais belas sequências do filme, com a fuga do assassino e a sua perseguição por Jones (Joel McCrea), que o irá levar a uma zona de moinhos, terminando por descobrir que o morto era um sósia do diplomata e que este fora raptado por uma organização desconhecida que pretende saber o teor de uma cláusula secreta, existente na alínea 27 de um Tratado, nascendo aqui o célebre MacGuffin de Alfred Hitchcock, porque nunca iremos saber o teor da célebre cláusula secreta.


A pouco e pouco, iremos percebendo que a Organização Pacifista esconde uma célula terrorista, chefiada pelo “bem-falante” Stephen Fischer (Herbert Marshall), que perante a presença incómoda de Jones (Joel McCrea) decide dar ordem para o eliminarem. Se por um lado iremos ter as diversas tentativas levadas a cabo pelos homens de Fischer, por outro lado a sua filha, que não suspeita das actividades do pai, começa a apaixonar-se pelo intrépido correspondente americano. Mas Jones não irá estar só na sua luta, porque um outro jornalista, Herbert Folliott (magnifico George Sanders), que há muito seguia as actividades do grupo pacifista decide juntar-se a ele. Estes dois homens tudo farão para encontrar Van Meer, acabando por descobrir o próprio Fischer a interrogar o diplomata, usando métodos “dignos” da Gestapo.


Alfred Hitchcock consegue, com este “Correspondente de Guerra” / “Foreign Correspondent”, oferecer uma obra perfeita de espionagem, mas também de propaganda pela causa aliada e nunca será demais fixar o final da película quando Jones, já numa Londres a ser bombardeada pela aviação nazi, lança o apelo à intervenção americana. Mas antes deste final, iremos assistir a uma das mais espantosas sequências do cinema de Alfred Hitchcock, quando o avião que transporta para a América, Fischer e a filha e com Jones e Folliott também a bordo é abatido por um navio alemão.


Toda a sequência é filmada de uma forma espantosa, com a queda do avião no oceano e a luta pela sobrevivência dos seus passageiros e aqui o falso líder pacifista, espião alemão, decide mergulhar no oceano, impedindo a asa do avião de se afundar, salvando desta forma os poucos sobreviventes que se encontram nela, sendo profundamente curioso o retrato que Hitchcock nos oferece do espião alemão, um homem com uma certa moral, conhecedor do mal. que se esconde por detrás da ideologia que comandava o seu país.


Recolhidos por um navio americano, Johnny Jones e Herbert Folliott irão dar uma lição de jornalismo, relatando a notícia via telefone, iludindo o capitão do navio que tinha proibido a transmissão do sucedido. Iremos assim entrar nesse território que o cineasta cultivou, a pontuação do humor no interior da tragédia, para mais tarde, já no final, surgir esse esforço de guerra que já referimos, com a presença de Johnny Jones junto aos microfones da rádio relatando os acontecimentos de uma guerra que iria durar longos anos, para mal de milhões de pessoas.


Mais uma vez Alfred Hitchcock revelou todo o seu saber de cineasta, oferecendo em “Correspondente de Guerra” / “Foreign Correspondent” uma das suas obras-primas, por sinal muito pouco conhecida.

Rui Luís Lima

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