segunda-feira, 30 de setembro de 2024

Egberto Gismonti - “Sol do Meio Dia”


Egberto Gismonti
“Sol do Meio Dia”
ECM 1116
ECM Records
1978

Egberto Gismonti – 8-string guitar, kalimba, piano, wood flutes, voice, bottle.
Nana Vasconcelos – percussion, berimbau, tama, corpo, voice, bottle. (track 2, 3 e 5)
Ralph Towner – 12-string guitar, bottle. (track 1 e 5)
Collin Walcott – tabla, bottle.(track 2 e 5)
Jan Garbarek – soprano saxophone (track 5)

1 – Palácio de Pinturas (Construção da Aldeia)– 5:33
2 – Raga (Festa da Construção) – 8;48
3 – Kalimba (Lua Cheia) – 5:14
4 – Coração (Saudade) – 5:58
5 –
A – Café (Procissão do Espírito)
B – Sapain (Sol do Meio Dia)
C – Dança Solitária Nº.2 (Voz do Espírito)
D – Baião Malandro (Fogo na Mata / Mudança)
Tempo Total – 24:50

Após o sucesso do álbum “Dança das Cabeças”, que de certa forma revelou ao universo musical a genialidade de Egberto Gismonti, seguiu-se um trabalho que irá cruzar as raízes bem brasileiras do músico com correntes jazzísticas que se revelaram num verdadeiro encantamento e referimo-nos a essa viagem musical que ocupa na íntegra o lado B do álbum “Sol do Meio-dia” e onde iremos encontrar logo no início Jan Garbarek nos saxofones, Ralph Towner na guitarra ao lado de Egberto Gismonti, no tema Café, evoluindo posteriormente a música para outras paragens e culturas, onde iremos reencontrar Nana Vasconcelos e Collin Walcott, dois músicos de eleição nos seus instrumentos, que infelizmente já partiram, mas que nos deixaram o testemunho da sua genialidade em diversas gravações.

Egberto Gismonti

Já no lado A deste álbum encontramos duetos, trios e solos maravilhosos. “Palácio das Pinturas” oferece-nos um dueto entre as guitarras de Egberto Gismonti e Rakph Towner, seguindo-se um trio em que descobrimos Egberto Gismonti, Nana Vasconcelos e Collin Walcott, na sua famosa tabla, sendo este diálogo pontuado pela percussão de Nana Vasconcelos, para entrarmos depois nas raízes mais profundas da Amazónia num dueto entre Gismonti e Vasconcelos, onde não faltam a kalimba, a flauta e o berimbau, encerrando-se este ciclo com as belas sonoridades do piano, tocado por Egberto Gismonti.


A música deste álbum é dedicada por Egberto Gismonti aos índios Sapain e Xingu, cujos ensinamentos se revelaram de enorme importância para o músico brasileiro, durante o período que passou com eles no interior da Selva Amazónia, segundo nos confessa o músico e compositor num belo texto, inserido no álbum “Sol do Meio Dia”, que se revela um dos mais belos de toda a discografia de Egberto Gismonti.

Gravado em Novembro de 1977 no Talent Studio, Oslo, por Jan Erik Kongshaug. Fotografias de Egberto Gismonti. Layout de Barbara Wojirsch. Produção de Manfred Eicher. Todos os temas são da autoria de Egberto Gismont

Rui Luís Lima

TV Séries - "O Ardil de Singapura" / "The Singapore Grip"


TV Séries
"O Ardil de Singapura" / "The Singapore Grip"
Episódios: 6
Actores: Luke Treadaway, David Morrissey, Elizabeth Tan, Charles Dance, Colin Meaney, Georgia Blizzard, Christophe Guybet, Luke Newberry.
Argumento: Christoper Hampton (baseado no livro de J. G. Farrell)
Realização: Tom Vaughan
Grã-Bretanha - 2020


Numa época em que as séries proliferam no pequeno écran e de qualidade tantas vezes medíocre, será de chamar a atenção para "O Ardil de Singapura" / "The Singapore Grip", Tudo aqui é perfeito, desde a direcção de actores e respectivas interpretações, a realização intocável de Tom Vaughan, até à produção britânica (com aquele toque de classe que nos habituou em tempos idos), que não se poupou a esforços e custos para recriar a Singapura desses anos de guerra, em que o Império Britânico acorda para o pesadelo japonês, enquanto vamos assistindo a intrigas várias e aos jogos perigosos de um triângulo amoroso, bastante perigoso.

Esta série respira Cinema!

Rui Luís Lima

Fernando Pessoa - "Poesia de Álvaro de Campos"


Fernando Pessoa
"Poesia de Álvaro de Campos"
Colecção: Obras de Fernando Pessoa nº.16
Páginas: 672
Edição de Teresa Rita Lopes
Assírio & Alvim

Conheci o Engenheiro Álvaro de Campos numa noite de Natal em que ele me foi apresentado por Fernando Pessoa e, desde então, este heterónimo viajante das palavras entrou no meu imaginário e com ele participei em viagens através de mares nunca antes navegados. Conheci piratas e naveguei em paquetes, conheci uma rapariga inglesa loira míope, acompanhante forçada de uma tia, a caminho de Durban e convivi em noites soalheiras com um casal oriundo do Novo Mundo que me apresentou a poesia de Walt Whitman, como se ela fosse essa erva que acompanha o caminhante ao longo dessa estrada longa que atravessa a América de uma costa a outra, com o Pacífico de um lado a invadir o areal e as ondas do Atlântico a oferecerem a sua musicalidade às estrofes dos poetas.

Fernando Pessoa por Almada Negreiros

De todos os poemas descobertos nessa véspera de Natal, o meu favorito, aliás já conhecido, intitula-se “Tabacaria” e começa assim “Não sou nada. / Nunca serei nada. / Não posso querer ser nada. / À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.”

Durante décadas li este poema sempre profundamente apaixonado, assim como um outro que se iniciava com “Cruz na Porta da Tabacaria”. Ao longo do tempo sempre associei estes dois poemas ao mesmo heterónimo, o saudoso Engenheiro Álvaro de Campos, tal como sucedia com a edição da Ática que me foi oferecida nesse longínquo ano de 1970 e que durante estes anos tem sido um dos meus escritores de cabeceira. Ao lado de Proust, Durrell e Sollers.

Mas um dia fui presenteado com uma nova edição da Poesia de Álvaro de Campos organizada pela estudiosa Teresa Rita Lopes, que nos oferece um volume onde descobrimos poemas até hoje desconhecidos do mundo e que, adormecidos na famosa Arca, permaneciam escondidos de todos. Tenho que confessar o meu fascínio por este volume de cerca de 650 páginas, no entanto fiquei verdadeiramente perplexo com a ausência do poema de Álvaro de Campos “Cruz na Porta da Tabacaria”, em virtude de Teresa Rita Lopes não considerar como autor do poema o heterónimo Álvaro de Campos.

Fernando Pessoa por Costa Pinheiro

Anos depois a editora Tinta da China lançou a “Obra Completa de Álvaro de Campos” organizada por Joaquim Pizarro e António Cardiello (que também recomendo) e verifiquei que o poema “Cruz na Porta da Tabacaria” fazia parte do volume e era atribuído a Álvaro de Campos, tal como sucedia na edição da Ática de “Poesias” de Álvaro de Campos.

Como a liberdade de pensar é um dos bens que mais amo, porque penso, logo existo, como aprendi no programa radiofónico “O Homem no Tempo”, emitido em finais dos anos setenta no FM do RCP e onde escutei poemas do Engenheiro numa maravilhosa montagem radiofónica de João David Nunes, decidi colocar neste maravilhoso trabalho encetado pela investigadora Teresa Rita Lopes o poema que considero em falta, atribuindo-lhe a página 326-A, sem qualquer polémica, e assim usufruir como o pequeno prazer de ler a poesia de Álvaro de Campos.

Rui Luís Lima

Fernando Pessoa
(1888 - 1935)

Cruz na Porta

Cruz na porta da Tabacaria!
Quem Morreu? O próprio Alves? Dou
Ao diabo o bem-estar que trazia.
Desde ontem a cidade mudou.

Quem era? Ora, era quem eu via.
Todos os dias o via. Estou
Agora sem essa monotonia.
Desde ontem a cidade mudou.

Ele era o dono da Tabacaria.
Um ponto de referência de quem sou
Eu passava ali de noite e de dia.
Desde ontem a cidade mudou.

Meu coração tem pouca alegria,
E isto diz que é morte aquilo onde estou.
Horror fechado da tabacaria!
Desde ontem a cidade mudou

Mas ao menos a ele alguém o via.
Ele era fixo, eu, o que vou.
Se morrer, não falto, e ninguém diria.
Desde ontem a cidade mudou.

Álvaro de Campos

Spaghetti- “Encontro de Ciclistas” / "Em Paris" / “Spaghetti e os Quadros a Óleo” - René Goscinny / Dino Attanasio


Spaghetti
“Encontro de Ciclistas” / “Au Rendez-vous des Cyclistes”
"Em Paris" / "À Paris"
“Spaghetti e os Quadros a Óleo” / “Spaghetti et la Peintoure à l’Houille”
Argumento: René Goscinny
Arte: Dino Attanasio
Colecção: Clássicos da revista Tintin nº.9
Páginas: 96
Álbum: Asa / Público

Spaghetti uma das mais belas criações de René Goscinny, irá ter ao longo da sua existência, um grande problema familiar: o seu primo, que nunca o larga e desta vez em "Encontro de Ciclistas" ele irá longe demais ao “convencê-lo” à força a ser co-proprietário de um hotel nas montanhas, que por sinal se encontra num estado lastimoso e é usado para fins duvidosos por uns ciclistas, ainda mais misteriosos…

René Goscinny
(1926 - 1977)

"Em Paris" é a minha aventura favorita de Spaghetti e desse seu primo mais chato do mundo: uma verdadeira lapa e foi a primeira história que li do simpático Spaghetti, nas páginas da revista Timtim, que escrevia Tintin com um "m", até Hergé se referiu a isso num filme que é exibido no seu Museu na Bélgica.

Dino Attanasio
(1925)

Já “Spaghetti e os Quadros a Óleo” revela-nos mais uma vez como o negócio das Belas Artes, nem sempre é belo e por vezes com contornos muito estranhos, com quadros avaliados em milhões a habitarem pequenas cozinhas pendurados por cima do fogão, mas isso já é outra "estória"...porque Spaghetti é um dos mais belos divertimentos saídos da imaginação de René Goscinny!

Rui Luís Lima

Andy Warhol - "Marilyn"


Andy Warhol
"Marilyn"
Pintura polímera sintética e serigrafia sobre tela.
101,5 x 101,5 cm.
Ano: 1964

Pier Paolo Pasolini - (1922 - 1975) - A Outra Margem da Memória!


Pier Paolo Pasolini - A Outra Margem da Memória!

Pier Paolo Pasolini, o cineasta "maldito", teve em Ninetto Davoli, companheiro inseparável de Totó no filme “Passarinhos e Passarões”, o amigo acima de qualquer suspeita, sendo aquele que permaneceu no círculo de Pasolini desde que ele decidiu fazer cinema até ao último dos dias do cineasta. E dizemos isto porque no dia em que o realizador foi assassinado, na praia de Óstia, jantou em casa de Ninetto na companhia da mulher deste e dos seus dois filhos.

"Accattone"

Mas por falar de amizades, e as de Paolo foram poucas mas duradoiras, nunca nos poderemos esquecer desse outro cineasta chamado Bernardo Bertolucci. O pai de Bernardo, um dos maiores poetas italianos, era amigo de Pasolini, tendo até editado um dos seus livros, mas no dia em que pela primeira vez o jovem Bertolucci viu Paolo, teve medo: tinham acabado de bater à porta dos Bertolucci e o filho do poeta foi abrir, quando deparou com a figura do futuro cineasta, então apenas poeta e este lhe disse que pretendia falar com o pai, Bernardo não o mandou entrar e fechou a porta, dizendo para ele esperar lá fora; Attilio Bertolucci, ao ver os receios do filho perante Pasolini, deu uma sonora gargalhada e disse-lhe que ele era um poeta seu amigo, um grande poeta, que escrevia assim a sua visão de “Roma Cidade Aberta de Roberto Rosselini:

"Mamma Roma"

«Que golpe no coração, perante aquele cartaz / já gasto… Aproximo-me, observo aquela cor / de um outro tempo que o rosto quente e oval / da heroína exibe, a palidez heróica do pobre, opaca, manifesta. / De súbito, entro! Sacudido por um clamor interior, / decidido a estremecer a cada recordação, / a consumar a glória do meu gesto. / Entro na arena, para o último espectáculo, / sem vida, personagens cinzentas, parentes, amigos dispersos pelos bancos, / perdidos na sombra, em círculos distintos / e esbranquiçados, no fresco receptáculo… / Subitamente, os primeiros enquadramentos. / Transtorna-me e arrebata-me… «l’intermitence du couer» / Encontro-me no escuro caminho da memória, nas misteriosas / câmaras onde o homem é fisicamente outro, / e o passado o banha com o pranto. /Contudo, tornado hábil pelo longo exercício, / não perco os fios: eis a Casilina, /sobre quem tristemente se abrem / as portas da cidade de Rosselini… / Eis a épica paisagem neo-realista, com os fios do telégrafo, as calçadas, os pinheiros, / os murozinhos descarnados, a mística / multidão, perdida nos afazeres quotidianos, / as tenebrosas formas de dominação nazi… / Quase emblemático já, o grito de Magnani, / sob as madeixas desordenadamente absolutas, / ressoa pelas desesperadas panorâmicas, / e nos seus olhares vivos e mudos / se adensa o sentido da tragédia. / É ali que dissolve e se mutila / o presente, e atroa o canto dos aedos.» (1)

"O Evangelho Segundo São Mateus"

Bernardo, um pouco envergonhado pelo seu medo, convidou Pasolini a entrar e este terminou por entrar na sua vida de cineasta, ao oferecer ao jovem Bertolucci o lugar de assistente de realização, durante a rodagem de “Accattone” e assim o futuro realizador de “1900” abandonou a poesia, tinha anteriormente recebido um prémio pela sua colectânea de poemas, decidindo partir para a conquista de outra forma de expressão: o cinema.

"Passarinhos e Passarões"

Curiosamente, foi devido a uma necessidade urgente de se exprimir de outra forma, para além das palavras escritas numa página em branco, que levou Pier Paolo Pasolini a se decidir pela Sétima Arte. Mas ele, nada sabia dessa nova arte e quando confessou a Fellini que pretendia fazer um filme, este disse que estava disposto a produzi-lo, no entanto necessitava de visionar algum trabalho do futuro cineasta.

"Rei Édipo"

Assim Paolo e Bernardo partiram para a aventura, mas quando Fellini viu os testes, desapareceu durante dias e o mesmo fez Pasolini, tal era o medo de ambos de confrontarem ideias acerca do que fora feito. Por fim, Federico Fellini confessou que não poderia produzir aquele filme, desistindo do projecto, mas outro produtor decidiu arriscar, oferecendo-lhe um excelente director de fotografia, para impedir os “excessos narrativos” de Pier Paolo Pasolini, o seu nome era Tonino Delli Colli, tendo a colaboração entre os dois homens sido estendida para outras películas, ao longo dos anos.

"Teorema"

“Accatonne” revelou-se como a pedrada no charco do neo-realismo e um cineasta começava a nascer, criando uma linguagem cinematográfica única, transformando-se rapidamente num Autor. O futuro acabaria por o revelar ao mundo. Ele que fez a sua “Medea” com Maria Callas na protagonista, mas dobrando a voz da Diva nas falas, através da sua amiga Laura Betti. Para muitos um choque. Tal como foi um choque quando ele ofereceu a sua visão do catolicismo, através do fabuloso “Il Vangelo Secondo Matteo” / “O Evangelho Segundo São Mateus”.

"Orgia"

Sempre polémico nos seus escritos, incompatibilizando-se com quase todos, a memória da morte do seu irmão durante a 2ª Grande Guerra às mãos dos partidários de Tito marcou-o para sempre, mas os escândalos que se foram criando à sua volta, muitos deles encenados mas alguns bem reais, começaram a tecer a sua perdição, como se fosse um pássaro de asas cortadas.

"Pocilga"

No início dos anos setenta do século xx, nasce a sua famosa “Trilogia da Vida” composta por “Il Decameron” / ”Decameron”, “I Racconti di Canterbury” / “Os Contos de Canterbury” e “Il Fiore Del Mille e Una Notte” / “As Mil e Uma Noites”, que iriam elevar a sua estrela ao firmamento cinematográfico, com o inevitável reconhecimento do seu génio. No entanto uma maçã, oferecida por uma “Eva” iria expulsá-lo do “Paraíso”, originando com a sua escrita a criação de mais inimigos, ao mesmo tempo que as suas noites eram cada vez mais perigosas.

"Medeia"

Por fim, num gesto perturbante, renegou a sua célebre “Trilogia da Vida” e decide “encenar” cinematograficamente os 120 dias da República de Salo, criada por Mussolini e seus seguidores, protegidos por um exército alemão à beira da derrota prestes a partir em debandada de uma Itália, à beira de ser conquistada pelas forças aliadas.

"Decameron"

“Salò o le 120 Giornate di Sodoma” / “Salo ou os 120 Dias de Sodoma” foi um imenso “escândalo”, tanto em Itália como em toda a Europa e foram poucos os que defenderam a simbiose da escrita do Marques de Sade com a História de Itália, onde a perversão andava de mãos dadas com a história recente. O cineasta não conseguiria através do seu inconformismo cativar o público, embora a aura de escândalo que a película oferecia, tenha conquistado um outro público.

"Os Contos de Canterbury"

Na primeira exibição da película, várias latas do filme foram roubadas da cabine de projecção e alguns pensam que as mesmas foram usadas para atrair Pier Paolo Pasolini à praia de Óstia, para as negociar e reaver, mas nessa noite fatal em que jantou pela última vez na companhia de Ninetto Davolli e a sua família, “Mama Roma” não o conseguiu levar de mota até aos braços de Anna Magnani, preferindo seguir o destino traçado pelo anjo negro de “Teorema”, ao encontro de uma morte violenta.

"As Mil e Uma Noites"

O mistério que envolveu a sua morte continua por deslindar, mas o seu cinema encontra-se bem vivo, continuando a oferecer uma das obras mais polémicas da Sétima Arte, à qual ninguém consegue ficar indiferente.

"Saló ou Os 120 Dias de Sodoma"

(1) – In “La religione del mio tempos”
“O Bosque Sagrado”
(Editora Gota de Água)

Rui Luís Lima

domingo, 29 de setembro de 2024

Rádio - Página 1!


Rádio - Página 1!

O “Página 1” era realizado pelo José Manuel Nunes e surgia na Radio Renascença no FM, após o principal e excelente serviço noticioso das 19 horas ou seja a partir das 19h30 até às 21h00 tínhamos da melhor música, com muitas das novidades vindas directamente de Londres, para além da música portuguesa com José Afonso, Sérgio Godinho e José Mário Branco, entre outros.

José Manuel Nunes

Mas também não me esqueço que seria talvez o programa de rádio mais atingido pela censura, que na época tinha uma lista de canções, cujos dirigentes deste belo país à beira-mar plantado, não apreciavam nada e assim, aconteceu-me estar à espera da emissão, pois gravava de lá umas “coisas” para um velho gravador, utilizando um pequeno microfone, que empunhava junto da coluna de som do rádio/gira-discos e surgia-me música clássica durante todo o espaço da emissão (hora e meia) e confessava com os meus botões de adolescente, lá os tramaram outra vez. Quando o “Venham Mais Cinco” do José Afonso, viu a luz do dia, (que continuo a considerar o melhor álbum da Música Popular Portuguesa), gravei quase todas as canções do álbum através do “Página 1”.


Na época, a música que por ali se ouvia, era um consolo para a nossa alma, acreditássemos ou não no Inferno e no Paraíso, porque Paraíso mesmo foi quando anunciaram que iriam passar na integra o “Tubular Bells” do Mike Oldfield, que andava nas bocas do mundo e cujo álbum ainda não chegara a Portugal e assim um dia tivemos o lado A do álbum e no dia seguinte foi a vez do lado B, que gravei numa cassete BASF de crómio em vez das de ferro, para aquilo durar e confesso que durou muito tempo. Antes tinha uma verdadeira manta de retalhos do Tubular Bells, já que o habitual final do lado A foi o primeiro a gravar (o mais divulgado na rádio), depois numa emissão a seguir ao almoço, já não me lembro do nome do programa, o Pedro Castelo divertiu-se a passar do lado B do disco, a parte com o “In the Cave”, com toda aquela gritaria que se escuta no álbum e dias mais tarde o António Sérgio, num domingo de manhã, passou os 8 minutos iniciais do “Tubular Bells”, até que chegou esse momento mágico em que o “Pagina 1” me ofereceu a oportunidade de ter o disco de fio a pavio.

Leonard Cohen

Na verdade ouvir rádio nesses tempos, e confesso que não sou nada saudosista, era profundamente gratificante e só para terminar, tenho que vos contar que o famoso indicativo do “Pagina Um” foi criado pelos “Pop Five Music Inc”, para o programa de rádio.

Rui Luís Lima

"Page One"
Pop Five Music Incorporate

TV Séries - "Rosemary & Thyme"


TV Séries
"Rosemary & Thyme"
Temporadas: 1, 2, 3.
Anos: 2003 - 2006
Felicity Kendal, Pam Ferris.
Criador: Clive Exton

Clive Exton, o responsável pela criação desta série, não é mais do que o argumentista da série Poirot (1989 - 1993), cujo contributo elevou a um ponto mais alto as aventuras do famoso detective belga criado por Agatha Christie. Recorde-se que nos inúmeros contos que vimos adaptados ao écran no original as personagens do capitão Hastings e da secretária Miss Lemon não figuram no original de Agatha Christie.


Já "Rosemary & Thyme" é de uma perfeição acima de qualquer suspeita, ao acompanharmos as aventuras de uma ex-policia chamada Laura Thyme (Pam Ferris), que um dia viu o marido a deixá-la por uma mulher muito mais jovem, enquanto a sua futura parceira de negócio paisagístico, Rosemary Boxer (Felicity Kendal), perde o emprego que tem na universidade e de um dia para o outro vê-se desempregada. Do encontro deste duo nasce o negócio de recuperar jardins, mas infelizmente durante o seu trabalho, sempre tão delicado e precioso, irão deparar-se com pequenos crimes, que irão alterar os seus tranquilos dias de trabalho.


Aproveito para recordar que a actriz Felicity Kendal, na sua juventude, pertenceu a um grupo de teatro itinerante que na célebre Jóia da Coroa ou seja a Índia, representava Shakespeare, tendo até o cineasta James Ivory realizado a maravilhosa película "Shakespeare - Wallah", no distante ano de 1965. "inspirando-se" na história dessa companhia teatral, sendo Felicity Kendal uma das protagonistas do filme, que navega na net.

Quando a série "Rosemary & Thyme" foi cancelada pela ITV estava prevista a rodagem de dois episódios em Portugal.

Rui Luís Lima

Revistas de Música - Mundo da Canção


Mundo da Canção
Surgiu a 19 de Dezembro de 1969
Terminou: Julho 1985
Fundador: Avelino Tavares
Periodicidade: Mensal
Preço: 3$50

O nº1 do "mundo da canção" teve uma tiragem de 4500 exemplares. Na capa deste n´º.10 temos a Joni Mitchell! O preço deste exemplar era de 3$50. Um número memorável, lido e relido, que fez as minhas delícias musicais era de capa vermelha e tinha uma coroa real na capa dedicado aos King Crimson e ao denominado rock progressivo, que na época dominava a área musical do rock. Já o cantor Paco Bandeira não recolhia grandes afectos na redacção da revista, qu apostava na divulgação da Música Popular Portuguesa.

Rui Luís Lima

"Both Sides Now"
Joni Mitchell

Revista Condor - (1951)


Revista Condor nº 1
Para adultos, maiores de 20 anos!
Lançado a 01 de Maio de 1951
Periocidade: Mensal
Preço: 2$50
Ano: 1951

O primeiro número da Colecção Condor, surgido a 1 de Maio de 1951, oferece-nos uma aventura de Tomahawk Tom, da autoria de Vítor Péon (desenho) e Edgar Gaygill (argumento).

Roussado Pinto
(1926 - 1986)

Recorde-se que Edgar Gaygill é um dos muitos pseudónimos de Roussado Pinto, esse escritor dos "sete instrumentos" amante da banda desenhada e que bem merece não ser esquecido, já Ross Pynn era o pseudónimo utilizado na escrita dos policiais.

Vítor Péon
(1923 - 1991)

Por outro lado Vítor Péon, um nome incontornável da banda desenhada portuguesa, estava nos seus inícios. Por seu lado a revista Condor irá ter, na segunda página antes da banda desenhada, um texto dos editores apresentando os objectivos desta colecção, que iria oferecer em cada número uma história completa de banda desenhada. Já na contra-capa era anunciado para o número seguinte uma aventura do famoso detective Rip Kirby. Por fim nunca será demais chamar a atenção para a capa que refere "para adultos, maiores de vinte anos"!

Rui Luís Lima

Audrey Hepburn - (1929 - 1993)


Audrey Hepburn
Ano: 1955

Salas de Cinema - Cinema Paris!


Salas de Cinema - Cinema Paris!

Ao entrar no Ciclo Preparatório, fui estudar para a Escola Manuel da Maia, perto dos Prazeres e inevitavelmente comecei a passar pela Rua Domingues Sequeira, no eléctrico 28, que rapidamente deixei de usar na vinda, para ficar com o dinheiro do bilhete, para comprar os livros de bolso, que então foram lançados no mercado, nesse ano em que se mudou de década e se entrou nos célebres anos 70.

Cinema Paris

Como não podia deixar de ser, parava sempre no Cinema Paris para ir espreitar os cartazes e as fotografias dos filmes, embora nessa época fosse com regularidade aos cinemas de Estreia e ao “palhinhas”, o famoso Jardim Cinema, do qual já falei aqui, porque a minha mãe trabalhava ali perto.

"O Homem Que Veio do Futuro"
Franklin Schaffner

Mas um dia, numas férias, entrei finalmente no Cinema Paris para ver “O Homem Que Veio do Futuro” / “Planet of The Apes”, realizado pelo Franklin Schaffner, com o Charlton Heston no protagonista (nessa época em que já fixava o nome dos actores, mas não ligava ao nome dos cineastas) e nunca mais me esqueci dessa sombra que, no final da película, surge na praia e quando a câmara, num movimento subtil de grua, me diz que o herói afinal estava na Terra, pois tratava-se da Estátua da Liberdade enterrada na areia, fixei para sempre na minha memória esse filme e o cinema onde o vi.

"Não Sou Digno de Ti"
Ettore Maria Fizzarotti

No entanto só irei regressar ao Cinema Paris, que foi inaugurado em 1931, nascido de um projecto do Arquitecto Victor Manuel Carvalho Piloto, quando fui para o liceu e na companhia de dois colegas de turma, uma vez por semana ali estávamos encostados ao lado do café em frente do Cinema Paris, desde as duas e meia da tarde, esperando pela abertura de uma porta lateral, para entrarmos discretamente, após termos deixado os 25 tostões no simpático porteiro e escutado a recomendação de não sairmos do lugar no intervalo, porque os filmes eram para maiores de 18 anos e o ano de 1974 ainda vinha longe.

"O Último Tango em Paris"
Bernardo Bertolucci

Era assim que passávamos as tardes de sábado e num dia em que a famosa porta lateral não deu sinais de vida, tivemos de entrar pela principal e um colega não habitual destas andanças cinematográficas ficou à porta e teve que se vir embora, porque nesta época ainda havia o polícia e o bombeiro sempre presentes, mas também os filmes com o Gianni Morandi e mais uma canção a temperar o melodrama, recordo-me do jovem na tropa mais a moça grávida e ela a dar à luz e ele a fugir do quartel e depois são abençoados com uma bela criança!

"O Dragão Ataca"
Robert Clouse

Com a chegada de Abril de 74, a censura terminou e nós corríamos a ver todos os filmes e foi precisamente no Paris que vimos o tão badalado “Último Tango em Paris” / “Ultimo tango in Parigi” do Bernardo Bertolucci, porque no S. Jorge, que estava sempre cheio com as excursões de espanhóis, a entrada seria barrada de certeza. Foi também por lá que vimos “O Dragão Ataca” / “Enter the Dragon”, com um “Bruce Lee” nacional, que estava na plateia e decidiu imitar o actor e caiu meio desamparado entre as cadeiras da plateia.

"Julieta dos Espirítos"
Federico Fellini

São estas gratas memórias cinéfilas que gosto de partilhar, incluindo esse dia em que um casal se aproximou de nós, que nos encontrávamos como sempre a fumar do outro lado da rua, à espera que a porta da entrada lateral se abrisse, e nos perguntou se os filmes eram bons e nós com ar de entendidos respondemos, claro é um Fellini (tínhamos começado a decorar os nomes dos cineastas e a ler revistas de cinema), mas à saída da sala, pareceu-nos que o casal não adorou nada a “Julieta dos Espíritos” / ´”Giulietta degli spiriti” quando passou por nós e nos fuzilou com o olhar, quanto à primeira película já não me recordo do nome.

"A Grande Farra"
Marco Ferreri

Assim, lá fomos fazendo a nossa escola de cinema até que chegou esse sábado em que vimos a professora de História a entrar no Cinema Paris para ver “A Grande Farra” / “La grande bouffe” do Marco Ferreri, refugiámo-nos no café em frente e só depois entrámos na sala pelo sítio do costume e confesso que, quando saímos, só falávamos nela e não no filme. Na segunda-feira seguinte percebemos que as aulas de História nunca mais seriam as mesmas.


Quando o Cinema Paris encerrou as portas a 20 de Outubro de 1981, já me encontrava a trabalhar e andava por outras salas de cinema, mas recordo-me dele com imenso carinho, porque faz parte das minhas memórias, tal como o café em frente e aquele pequeno muro ao pé das escadas, onde estávamos sempre encostados. Hoje, sempre que passo pelo Jardim da Estrela recordo-me do magnífico Cinema Paris, cujo edifício meio-arruinado teima em permanecer de pé, para que alguém se lembre dele e decida o seu destino.

Rui Luís Lima

sábado, 28 de setembro de 2024

Rádio - À Sombra de Edison!


Rádio - À Sombra de Edison!

Foi em 1982 que, Jorge Gil, o responsável por esse incontornável programa de Rádio chamado “Em Órbita”, decidiu oferecer-nos uma nova aventura e se preferirem uma nova forma de fazer rádio, derrubando fronteiras e métodos e criando imagens que nos iriam absorver por completo, porque em “À Sombra de Edison”, não dava mesmo para estarmos a ler um livro e ouvir boa música, porque “À Sombra de Edison” era o Cinema, com maiúsculas, para se ver/escutar na rádio, captando por completo a atenção do ouvinte.

Jorge Gil
(1945 - 2019)

Mais uma vez Jorge Gil contou com a colaboração de Cândido Mota, que com a sua célebre voz nos convidava a seguir os passos do homem neste planeta e assim íamos escutando um conjunto de sonoridades e textos oriundos das mais diversas proveniências, que com um fio condutor nos iriam obrigar a pensar, neste mundo em que vivemos, recordando o passado e interrogando o futuro, como esse momento em que Neil Armstrong pisou a superfície da Lua (recordo-me de acompanhar a emissão televisiva ainda criança escutando as palavras de Eurico da Fonseca) e em “À Sombra de Edison” revivi esse momento, mas desta vez o ouvinte encontrava-se no interior da Nasa e acompanhava tudo pela primeira vez.

Esta aventura de Jorge Gil, com a habitual cumplicidade de Cândido Mota durou apenas seis meses, de Fevereiro a Julho de 1982, mas foi uma aventura radiofónica que permanece na minha memória para sempre, tal como as emissões do “Em Órbita” da segunda fase do programa dedicado à Música Antiga tocada em instrumentos da época, que abriu para sempre os meus horizontes musicais.

Rui Luís Lima

"Also sprach Zarathustra Op.20 - 1. Prelude"
Richard Strauss