quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Douglas Sirk - "Sublime Expiação" / "Magnificent Obsession"


Douglas Sirk
"Sublime Expiação" / "Magnificent Obsession"
(EUA – 1954) – (108 min. / Cor)
Rock Hudson, Jane Wyman, Barbara Rush, Agnes Moorehead, Otto Kruger.

Esta obra de Douglas Sirk, realizada em 1954, é um “remake” do filme com o mesmo nome, que John M. Sthal levou ao grande écran em 1935, com Robert Taylor e Irene Dunne nos protagonistas, sendo ambos os filmes oriundos dos mesmos Estúdios “Universal” que, na época, tinham por norma fazer “remakes” de obras que eram grandes sucessos e das quais ainda detinham os direitos, obtendo desta forma lucros bastante elevados.


Dezanove anos depois, Douglas Sirk irá refazer a obra, introduzindo a cor onde outrora vivera o preto e branco, ao mesmo tempo que opta por filmar em exteriores, ao contrário de John Sthal que rodou tudo em Estúdio, uma prática da época. No entanto, a Suiça que Douglas Sirk nos oferece é recriada em Estúdio, sendo curioso o facto de, nesta segunda versão, substituir a Paris da primeira versão, essa eterna cidade dos apaixonados. Nesse país iremos encontrar reunidas três sumidades da ciência, para fazerem regressar a luz aos olhos de Helen Phillips (Jane Wyman).


Nesta nova versão, mais uma vez produzida por Ross Hunter, descobrimos que Douglas Sirk decidiu explorar até ao limite o melodrama, eliminando algumas sequências com humor incluídas na versão de Sthal, ao mesmo tempo que nos oferece a sua marca de autor, através da habitual montagem no interior do plano, explorando ao máximo a composição desse mesmo plano, não descurando o mais pequeno pormenor, jogando mais uma vez de forma assombrosa com as cores. Embora esta marca da importância da cor na composição do plano seja apanágio de Douglas Sirk, também a poderemos encontrar no primeiro filme realizado a cores oito anos antes por John M. Stahl, “Amar Foi a Minha Perdição” / “Leave Her to Heaven”, uma das obras-primas do melodrama.


Por outro lado, a forma como é utilizada a banda sonora, com a introdução de “coros celestiais” a pontuar diversas sequências, como se Deus estivesse ali presente, eleva o sentido melodramático de “Sublime Expiação” / “Magnificent Obsession” até esse território do Divino.


Aliás, Thomas Schatz refere-se a esta questão da seguinte maneira: «Em certo sentido, todos os filmes de Hollywood podem ser caracterizados como melodramáticos. Numa definição (estrita) do termo, o melodrama refere-se às formas narrativas que combinam música (melos) e drama. A utilização hollywoodesca da música de fundo pretendeu sempre dar aos filmes uma dimensão formal que se constituísse como sua auréola, uma pontuação emocional.» E é precisamente isso que faz Douglas Sirk no seu “Magnificent Obsession” / “Sublime Expiação”, nos momentos de maior clímax da película, como se o destino daquelas personagens estivesse dependente da vontade de Deus.


No início do filme iremos conhecer Bob Merrick (Rock Hudson), um playboy rico e mimado, que pretende bater um recorde de velocidade na água, mas o seu barco vira-se depois de passar os 240 km e de imediato vão buscar um aparelho reanimador, que se encontra em casa do Dr. Phillips. Durante o processo de reanimação de Merrick, o médico sofre um ataque cardíaco e morre em virtude de o seu aparelho não se encontrar na sua casa.


O drama fica instalado e quando Bob Merrick se cruza com a viúva do Dr. Phillips (Jane Wyman) desconhece a sua identidade. Mas quando sabe finalmente quem ela é, tudo fará para reparar o seu erro, começando a olhar a vida segundo a doutrina do amável Dr. Phillips, que um dia lhe é contada pelo pintor Edward Randolph (Otto Kruger) mas, como não podia deixar de ser, a tragédia espreita ao virar da esquina, de forma a oferecer-nos um poderoso melodrama.


Rock Hudson, que surge aqui mais uma vez a ser dirigido por Douglas Sirk, entra definitivamente no estrelato, enquanto Jane Wyman, na época casada com Ronald Reagan, cumpre de forma perfeita com o que lhe é exigido. Aliás, foi o enorme sucesso obtido por este par junto do público, que levou o produtor Ross Hunter e Douglas Sirk a juntá-los de novo, no ano seguinte, nessa obra-prima intitulada “O Que o Céu Permite” / “All That Heaven Allows”. Por outro lado “Sublime Expiação” / “Magnificent Obsession” oferece-nos um conjunto de secundários que não deixam os seus créditos por mãos alheias: Barbara Rush interpretando Joyce Phillips, a filha do Dr. Phillips, que na época já tinha 27 anos, embora na película isso esteja bem camuflado, é excelente na sua composição, recorde-se que ela terá o seu momento alto, dois anos depois, quando fará de mulher de James Mason em “Bigger Than Life” de Nicholas Ray; Agnes Moorehead, na figura da enfermeira e amiga de Helen, não precisa de apresentações porque todos a conhecemos do Mercury Theater de Orson Welles e sabemos o seu valor; enquanto Otto Kruger, a interpretar o pintor Edward Randolph, foi na época um dos mais seguros secundários de Hollywood, certamente lembram-se dele na figura do nazi de “Sabotagem” / “Saboteur” de Alfred Hitchcock.


Mais uma vez, a habitual e serena direcção de actores de Douglas Sirk oferece-nos os seus frutos, tendo em conta a liberdade que dava aos movimentos dos actores no plateau, na composição das suas personagens. Depois de tudo o que escrevemos, só poderemos concluir que “Sublime Expiação” / “Magnificent Obsession” permanece uma das obras incontornáveis da filmografia de Douglas Sirk.

Rui Luís Lima

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