“Perseguição Impiedosa” / “The Chase”
(EUA – 1965) – (133 min. / Cor)
Marlon Brando, Robert Redford, Jane Fonda,
James Fox, Angie Dickinson, E. G. Marshall, Robert Duvall.
Arthur Penn é um cineasta que neste novo século se encontra um pouco esquecido, mas se falarmos que ele é o autor (porque se trata de um verdadeiro autor) de “Bonnie and Clyde”, esse casal de gangsters que fez história, de imediato todos se recordam dele.
Como muitos, iniciou a sua actividade no Teatro, passando depois para a Televisão (NBC), onde na prática fez os seus estudos, tendo tido o seu baptismo de fogo em “Vicio de Matar” / “The Left-Handed Gun” e de imediato ficou associado a uma certa violência no cinema, embora distante daquela que nos iria oferecer Sam Peckinpah, um outro cineasta célebre e pertencente à mesma geração, também ele, infelizmente, um pouco esquecido.
Se olharmos para a filmografia de Arhur Penn, encontramos obras como “O Pequeno Grande Homem” / “Little Big Man”, uma revisão da história do Oeste Americano ou esse “western” nostálgico intitulado “Duelo no Missouri” / “The Missouri Breaks”, para já não falar nessa película espantosa chamada “Quatro Amigos” / “Four Friends”, que maravilhou a minha geração. Com ele trabalharam actores como Marlon Brando, Jack Nicholson, Paul Newman, Warren Beaty, Robert Redford e Dustin Hoffman.
Marlon Brando, o célebre actor do método, foi um dos repetentes e quando o encontramos em “Perseguição Impiedosa” / “The Chase” ele está no auge da sua brilhante carreira, sendo a sua interpretação extraordinária e inesquecível.
“The Chase” é um daqueles filmes que retrata de forma profunda a América interior dos anos sessenta, do século xx, essa América onde o racismo, o ódio e a violência convivem de forma subterrânea e onde um simples fósforo serve para atear a violência, da qual iremos ser espectadores ao longo da película.
Partindo de um argumento de Lilian Hellman, argumentista e dramaturga, companheira de Dashiell Hammett, cuja vida já foi retratada no cinema por Fred Zinneman, no célebre “Júlia”, entramos na vida de uma pequena cidade dominada por um magnata chamado Val Rogers (E. G. Marshall), dono do banco local, mas também de longos territórios onde o petróleo corre e no entanto ele é muito mais do que isso, porque é dono de todas aquelas vidas, até o xerife (Marlon Brando) lhe deve o lugar. E será nesta paz podre que um homem chamado Bubber Reeves (Robert Redford), nascido na cidade, irá servir de rastilho para uma explosão de selvajaria perfeitamente incontrolável.
Bubber Reeves é um daqueles jovens a quem a vida foi sempre madrasta, logo aos seis anos foi acusado de roubar cinquenta dollars, tendo sido enviado para o reformatório, depois de ser obrigado pela mãe a confessar o roubo que não fez, seria o seu amigo Edwin Stewart (Robert Duvall) o autor do pequeno roubo, que irá viver o resto da vida sem remorsos pelo acto praticado. Saído do reformatório, Bubber será sempre um “outsider” e embora conviva com a sua geração na cidade que o viu nascer, acabará por ir para a prisão, porque o seu destino estava traçado à muito, apesar da inocência viver sempre no seu interior.
A fuga de Bubber da prisão e o seu regresso à “pacata” cidade irá despoletar uma série de acontecimentos, que terminarão da pior forma possível, porque a sua presença destabiliza a vida de uma série de famílias. Será este o retrato poderoso que nos é dado ao longo de um dia e de uma noite, oferecido por Arthur Penn. Aqui iremos encontrar a violência e o racismo no seu estado mais “puro”, onde a justiça é feita sempre pelos detentores do capital, e acompanhamos ao longo da película a verdadeira via-sacra de Bubber Reeves.
Marlon Brando representa aqui o homem que pretende impor a lei, mas a sua acção será sempre condicionada por Val Rogers que domina tudo e todos. Inicia-se uma verdadeira caça ao homem quando se sabe da presença do fugitivo na cidade; e se o xerife o pretende proteger e a única forma é a sua prisão, já toda uma população sedenta de sangue irá impedir por todos os meios que isso aconteça.
Anna Reeves (Jane Fonda) é a única pessoa que pode proteger Bubber Reeves, como ele bem sabe, mas até ela o traiu porque mantém uma relação com o filho do magnata. Porém, tanto Anna como Jake Rogers (James Fox) irão fazer tudo para o salvar de ser linchado, pagando o segundo com a própria vida pelo seu gesto, porque a multidão fica incontrolável ao saber que Bubber se encontra refugiado num cemitério de automóveis, uma das sequências mais perturbantes do filme.
Mais uma vez a interpretação de Marlon Brando é espantosa, tendo dado até diversos contributos para a realização, embora por vezes Arthur Penn não tenha aceitado as suas sugestões, ficando célebre a sequência em que o xerife é violentamente agredido na esquadra por três dos homens que pretendem saber o local onde Bubber se esconde e onde descobrimos uma das famosas assinaturas de Arthur Penn.
Depois temos todas as histórias das pequenas e mesquinhas vidas de uma população que vive virada para si própria, desde o adultério à divisão de classes, passando pelo pequeno valor que tem a diferença da cor da pele, (ou seja nenhum, como veremos, já que o xerife Calder é obrigado a prender o negro que esconde Bubber, para lhe salvar a vida). Por outro lado encontramos também aqui aquelas personagens que, com a “melhor das intenções”, vão espalhando a intriga em busca da violência, tudo a bem da comunidade.
E quando o xerife Calder (Marlon Brando) se encaminha para a esquadra, levando preso Bubber, rodeado pela multidão que sedenta de sangue assiste aos acontecimentos, iremos assistir à sua morte por um dos homens que anteriormente tinha agredido selvaticamente o xerife. Assassinato que imita o de que foi alvo Lee Oswald o “assassino oficial” de John Kennedy.
Em “The Chase” Arthur Penn oferece-nos esse sul que tantas vezes serviu de tema a Tennesse Williams e que tão bem Richard Brooks levou ao écran em filmes como “Corações na Penumbra” / “Sweet Bird of Youth ou “Gata em Telhado de Zinco Quente” / “Cat on a Hot Tin Roof”.
Se alguns falaram na época em intervenções do produtor Sam Spiegel (um dos mais importantes dos anos sessenta, recorde-se a sua colaboração com David Lean), ela nunca irá alterar a força que este filme possui, a qual se mantém passado meio-século sobre a sua feitura.
Descobrir “The Chase” / “Perseguição Impiedosa” é entrar pela porta grande do cinema.
Rui Luís Lima
Arthur Penn deixou-nos uma filmografia repleta de excelentes filmes e "the Chase" é uma das suas obras-primas, com uma argumento poderoso, um elenco de luxo e uma realização genial!
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