“A Estratégia da Aranha” / “La Strategia Del Ragno”
(Itália – 1970) – (100 min. / Cor)
Giulio Brogi, Alida Valli, Pippo Campanini,
Franco Giovanelli, Tino Scotti.
“A Estratégia da Aranha” surge na obra de Bertolucci como um filme feito contra o sistema de Hollywood, recorde-se que o cineasta rodava então a sua quarta película, aos trinta anos de idade e certamente nessa época ainda estariam longe no seu horizonte as co-produções internacionais e os Oscars, embora o militantismo de esquerda que o caracterizou e teve o seu ponto alto em “1900”, seja já possível de detectar nesta película.
Partindo de um conto de José Luís Borges, intitulado “Tema do Traidor e do Herói” publicado no livro “Ficções”, um dos mais célebres do autor argentino, Bernardo Bertolucci decidiu passar a acção para a Itália dos anos 30 e 60 (sec.xx), enquanto no livro de Borges o escritor colocava várias hipóteses de cenário: “a Polónia, a Irlanda, um Estado Sul-Americano ou Balcânico”, demonstrando desta forma como o tema do traidor na política possui um espaço universal.
Por outro lado Bernardo Bertolucci não resistiu a introduzir uma referência de peso, alterando o nome da povoação onde o filme foi rodado, cuja designação é Sabbionata para Tara, numa espécie de homenagem a “E Tudo o Vento Levou” / “Gone With the Wind”, aliás as duas casas são possuidoras dos mesmos traços arquitectónicos, filmados com mestria pelo genial Vittorio Storaro, que aqui inicia a sua colaboração com o cineasta e cujos frutos futuros serão extremamente saborosos, como todos sabemos.
Encontramo-nos assim num território cinematográfico em cuja acção se irá passar em duas épocas distintas: os anos 30 em que viveu esse traidor político e os anos sessenta em que o filho desse mesmo homem pretende saber o que se passou na realidade, optando Bertolucci por nos oferecer um relato em que os dois períodos convivem de mãos dadas e onde iremos descobrir como um pacto de silêncio por vezes é profundamente duradouro. E aqui temos a história de um militante político que um dia decide trair a sua causa e os seus companheiros de ideologia, sendo descoberto por estes. E, ao saber que será morto, propõe aos companheiros um modelo de morte em que sairá como herói e nunca como traidor, para não quebrar a moral e a luta dos outros militantes do partido.
E assim a história será escrita por Athos (Giulio Brogi) e por aqueles que traiu quando, à saída da Ópera onde assistiu ao “Rigoletto”, será morto por “desconhecidos”, sendo o crime de imediato apontado às forças que ele e os seus companheiros combatiam. Curiosamente Bernardo Bertolucci optou pelo mesmo actor, Giulio Brogi, para representar os dois papéis, o do traidor e o do filho que pretende saber a verdade dos factos, mas existe o pacto de silêncio cumprido pelos habitantes da aldeia, apesar da passagem dos anos, onde Draifa (Alida Valli) a mulher que tão bem conheceu Athos tem um papel de relevo na preservação da memória, transformando desta maneira para sempre a traição em heroísmo. Porque, como um dia nos demonstrou John Ford, quando a lenda se transforma em realidade que se publique a lenda, porque ela passou a ser fidedigna e a história, como sabemos, termina sempre por falar nos vencedores e nunca nos vencidos.
A “A Estratégia da Aranha” / "La strategia del ragno", surge assim como uma bela entrada para o conhecimento do período inicial de um jovem cineasta, onde pontificam obras com "Antes da Revolução" / "Prima della rivoluzione" e "O Conformista" / "Il conformista", que anos mais tarde irá fazer uma das obras mais belas e politizadas do cinema italiano: o célebre “1900”.
Rui Luís Lima
Bernardo Bertolucci - (1941 - 2018)
ResponderEliminarClassificação: 4 estrelas (****)
Estreia no Festival de Veneza: 25 de Agosto de 1970.