ECM Records - Edition of Contemporary Music!
Descobri o jazz, ainda miúdo, na célebre programa “Cinco Minutos de Jazz” do José Duarte, então incluído na “23ª Hora” com emissão na Rádio Renascença, por ali fui escutando os sons e os nomes desse universo que nunca mais deixou a minha companhia. Depois, como não podia deixar de ser, comecei a ir ao Festival de Jazz de Cascais, nessa época em que o Luís Villas-Boas nos oferecia esse fabuloso encontro com esta maravilhosa música, trazendo, tantas vezes nomes dos mais sonantes do panorama mundial. Por ali andava, tantas vezes sozinho, outras vezes acompanhado, perfeitamente fascinado com o que via e ouvia, descobrindo essa maravilhosa arte da improvisação, assim como a democraticidade existente entre os músicos.
Comecei então a frequentar a loja do Valentim de Carvalho na Rua Nova do Almada, nessa época em que o cliente da zona de jazz e clássica, situada na cave, até podia escolher o disco que pretendia escutar e levá-lo consigo até a um dos gira-discos existentes numa das mesas, colocá-lo no prato e ficar a ouvir a música tranquilamente. Descobri alguns intérpretes e compositores através de conversas com o Rui Neves, que por vezes andava por lá. Mas nunca mais me esqueço do dia em que escutei pela primeira vez o “Arbour Zena” do Keith Jarrett. Primeiro fiquei fascinado pela capa do disco da ECM Records, editora alemã que então desconhecia e depois ao escutar aqueles acordes de piano acompanhados por uma orquestra de cordas, mais o contrabaixo do Charlie Haden e o saxofone do Jan Garbarek, percebi que me encontrava no Paraíso. O disco era mais caro do que o habitual, mas depois de contar o dinheiro que tinha no bolso e ver que chegava, não resisti em o comprar.
Na semana seguinte fartei-me de falar sobre o disco com os meus amigos de liceu, até que talvez cansados do meu entusiasmo, decidimos ir todos até ao Valentim de Carvalho, para eles ouvirem o Keith Jarrett. Curiosamente nesse dia a loja tinha feito uma montra só com discos da editora de Manfred Eicher, ficámos perplexos com o que víamos, pois estávamos perante uma verdadeira exposição. Mal chegámos à cave comecei a procurar os discos para os ver melhor e escutar alguns, descobri um universo até então desconhecido e comecei a fixar os nomes de Ralph Towner, Eberhard Weber, Terje Rypdal, Pat Metheny, Jan Garbarek, entre muitos outros e claro a magia do piano de Keith Jarrett e os seus concertos a solo.
Mais ou menos por essa época o FM do Rádio Clube Português começou a transmitir no programa “Fórum”, uma rubrica de jazz, que ía para o ar por volta das 21h30 com duração de meia-hora, da responsabilidade do Jorge Lopes (essa voz inconfundível das transmissões do desporto na RTP), em que eram divulgadas precisamente as edições da ECM Records. Fiquei de tal forma fascinado com o universo que acabara de descobrir que o rock começou a fazer parte do passado. E ainda hoje quando olho para os meus cds, descubro que mais de metade deles pertencem à editora alemã de Manfred Eicher, que um dia nos ensinou que aquele som era o mais belo depois do silêncio, tendo até alguns, naquela época, catalogado esse som como jazz de câmara.
Hoje ao escutar os discos da editora ECM Records sou de imediato convidado a ser um ouvinte atento e fascinado e são muitas as vezes em que sentado no sofá fico a escutar esta maravilhosa música sentindo a passagem das horas, como se estivesse à beira mar, numa praia deserta.
O segredo desta editora alemã reside no cuidado com que Manfred Eicher, também ele músico e cineasta, coloca na produção dos seus discos, oferecendo-nos uma música que se transformou num som único: por ali sentimos a força do jazz e a sua liberdade, mas também a sua melancolia e beleza, ao mesmo tempo que descobrimos não existirem fronteiras entre os seus intérpretes, sejam eles americanos, europeus, árabes ou indianos, assim como a origem dos instrumentos que tocam.
Com o surgimento da ECM New Series a editora estendeu o seu olhar também para esse outro universo denominado vulgarmente por música erudita e mais uma vez fomos surpreendidos pela forma como ela é a bordada, desde o barroco, passando pelo período romântico, até chegar a esse espaço contemporâneo onde coabitam as mais diversas expressões musicais
A beleza da música oriunda da ECM Records – Edition of Contemporary Music ensina-nos que a harmonia no mundo é possível. Como seria bom, um dia, os homens perceberem que o universo foi feito para ser amado e não odiado, vivermos todos em paz e não destruindo e matando em guerras que nunca conduzem a nada.
Rui Luís Lima
A ECM Records que tem no produtor Manfred Eicher a alma da editora alemã, a mais importante editora europeia de jazz que navega também em outros géneros musicais, teve desde logo algo que a distinguia das restantes casas editorias discográficas: a produção cuidado dos discos, a fabulosa prensagem em vinil dos mesmos (o cd ainda nao tinha nascido em 1969) e o grafismo das capas dos diversos álbuns simplesmente fabulosos. Em Portugal os discos eram importados directamente da Alemanha pela Dargil, que tinha a loja na Av. 5 de Outubro em Lisboa.
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